Monday, July 06, 2009

À procura da Nova Novidade

“Muitos dos que buscaram e encontraram a fortuna no Vale do Silício poderiam perfeitamente tê-la encontrado na Wall Street dos anos 80 ou na Londres da década de 1860. Mas há um certo tipo de pessoa que acertou em cheio no Vale do Silício recentemente que não teria acertado em nenhum outro momento da história. Acertou porque estava particularmente bem-dotado para este momento histórico específico. Tinha a estrutura para trabalhar na fronteira da vida econômica quando a fronteira estava mais uma vez acessível. Foi concebido para a rápida mudança social e tecnológica. Era o deflagrador das novidades.
É bastante estranho, mas esse personagem, que está no centro de uma das grandes explosões econômicas da história, e que, na verdade, tem o detonador entre as pernas, não sabe explicar o que faz para ganhar a vida. Quando alguém se dispõe a encontrar a nova idéia ou a nova tecnologia que vai a) enriquecê-lo, b) atirar indústrias inteiras no turbilhão, c) fazer com que a gente comum se levante e diga: “Meu Deus, algo mudou”, isso não é ciência. Ele não se ocupa do que qualquer pensador sério chamaria de pensamento. A não ser que ganhe muito dinheiro, não será sequer tratado como homem de negócios, pelo menos não por homens de negócios sérios. Ele pode chamar a si mesmo de “empreendedor”, palavra um tanto desmoralizada pelo uso excessivo. Na verdade, não existe um termo adequado para o que ele faz. A primeira vez que percebi esse problema foi quando observei uma dessas pessoas – um homem que ganhara um bilhão de dólares – tentar preencher um simples questionário. Na linha em que se pedia que informasse sua ocupação, ele não sabia o que escrever. Não havia um nome para o que ele fazia. Buscador? Ele não podia escrever isso.
Por falar nisso, não existe nome para o que ele busca, tipicamente uma tecnologia ou uma idéia à beira da viabilidade comercial. A nova novidade. É mais fácil dizer o que a nova novidade não é do que o que ela é. Não é necessariamente uma nova invenção. Não é sequer uma nova idéia necessariamente – quase tudo já foi considerado por alguém em algum momento. A nova novidade é uma idéia que está pronta para ser levada a sério pelo mercado. É a idéia que precisa apenas de um pequeno empurrão para cair na aceitação geral e que, depois do empurrão, vai mudar o mundo. Quem busca novas novidades não se enquadra em nenhuma concepção estabelecida de como as pessoas devem ganhar a vida. Ele tateia no escuro. Encontrar a nova novidade não depende só de senso de oportunidade ou de preparo técnico ou financeiro, mas essas qualidades ajudam. A busca é acompanhada daquela doce e dolorida sensação que experimentamos quando não conseguimos nos lembrar de uma palavra que parece estar na ponta da língua. Para a maioria das pessoas, lembrar-se da palavra traz um alívio quase físico. Elas se recostam na cadeira e tentam fugir de outras palavras difíceis. Mas a pessoa que ganha a vida buscando novas novidades não é como a maioria das pessoas. Ela não quer se recostar em cadeira alguma. Precisa continuar tateando. Prefere viver eternamente no desconforto picante e doce de não saber exatamente o que quer dizer. Uma das pequenas ironias do progresso econômico é que, mesmo freqüentemente resultando em níveis mais altos de conforto, ele dependa de gente que prefere não ficar confortável demais.”¹
A meio caminho saiba-se lá do quê, sem saber o que se quer, com uma idéia muito vaga do que não é querido, siga-se a saga tortuosa e obtusa à procura da Nova Novidade!
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1 - LEWIS, Michael. A Nova Novidade: uma História do Vale do Silício. Trad. Ricardo Rangel. São Paulo: Companhia das Letras. 2000. P. 12-14.

Friday, January 30, 2009

Rabugem

"En verdad, una sucia corriente es el hombre. Es necesario ser un mar para poder recibir una sucia corriente sin volverse impuro. Mirad, yo os enseño el superhombre: él es ese mar, en él puede sumergirse vuestro gran desprecio. ¿Cuál es la máxima vivencia que vosotros podéis tener? La hora del gran desprecio. La hora en que incluso vuestra felicidad se os convierta en náusea y eso mismo ocurra com vuestra razón y con vuestra virtud. La hora en que digáis: «¡Qué importa mi felicidad! Es pobreza y suciedad y un lamentable bienestar. ¡Sin embargo, mi felicidad debería justificar incluso la existencia!»" (Nietzsche. Así Habló Zaratustra.)


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Os traços marcados do sorriso

Não encobrem a rabugem

Que escorre do cenho franzido

Saturday, December 27, 2008

Os jovens "idiotas" e a internet

"ÉPOCA –O que está errado com os jovens?
Mark Bauerlein – Graças à estabilidade política e ao longo período de prosperidade econômica vivido pelos Estados Unidos, os jovens cresceram sem conhecer a dura realidade de outras partes do mundo, com crises econômicas e políticas, desemprego, e revoluções. A conjunção benéfica de fatores manteve os jovens americanos isolados em um casulo infantil. Quando converso com estrangeiros sobre a nova geração americana, eles me dizem que um americano de 20 anos age como se fosse um adolescente de 14 anos em seus países.
(...)
ÉPOCA – O senhor chama os jovens de bibliófobos. Por quê?
Bauerlein – Bibliófobos são pessoas alfabetizadas que escolhem não ler. Fico surpreso ao ver um adolescente lendo um romance num parque. Imagine o que ele poderia estar fazendo... Jogar videogame, escrever um blog, navegar na web. São ações que exigem a leitura rápida de frases curtas em uma tela. Pense num videogame. Ele só existe para estimular os sentidos. Ele fornece todas as imagens. Tudo é muito rápido, para manter o jogador absorto. Ler é demorado, exige imaginação, há palavras desconhecidas. A sensação de tempo decorrido é muito diferente. Pode-se passar duas horas jogando um game e parecer que foram 20 minutos. Mas cinco minutos de leitura podem parecer uma hora. É claro que os adolescentes não gostam de ler! Ler dá trabalho.
(...)
ÉPOCA – Qual é a conseqüência da falta do hábito da leitura para esta geração?
Bauerlein – Várias aptidões necessárias para a maioria das profissões não são adquiridas jogando games, mas pela leitura. Quem lê livros melhora a compreensão de texto, a redação e enriquece o vocabulário. Uma pesquisa feita em universidades americanas, em 2007, mostrou que dois terços dos professores acham o nível atual dos alunos pior que o de dez anos atrás. Mais de 42% dos ingressantes na faculdade precisam freqüentar aulas de reforço em compreensão de texto, redação e Matemática. Apesar de terem sido aceitos pelas universidades, eles não têm o nível mínimo para freqüentá-las."¹

A entrevista do Prof. Bauerlein incitou-me mais alguma reflexão sobre um tema que há muito me desperta a atenção. De um modo geral, diz com a nossa capacidade de expressão, seus limites, suas possibilidades mesmo, em face do "equipamento" de que nós dispomos para tanto, o que se relaciona, em última instância, com nossa constituição¹. Quando falo "nós", relaciono não apenas os seres humanos, mas todo e qualquer ente que possa desempenhar esta mesma atividade.

Essa questão ganha interessante (e bastante acessível) enfoque quando se discute o efeito causado pelo acesso à rede mundial de computadores sobre os jovens - no caso da entrevista, particularmente sobre os jovens americanos. A falta do hábito da leitura (de livros), associada à utilização de uma linguagem de símbolos mais simples e menos elaborada no todo, chega a ser dada como causa de um pior preparo dos estudantes.

Todavia, como pretendo demonstrar, esta é uma opinião que se mostra equívoca, por não tomar devidamente em conta os próprios pressupostos que, pretensamente, sustentam-na. Senão vejamos.

O professor fala em "desconhecimento", por parte dos jovens ianques, da dura realidade dos outros lugares do mundo, e que isso os teria levado a um estado de "isolamento" que os haveria "idiotizado" - o título do último livro do entrevistado é The Dumbest Generation (algo como que A Geração mais Idiota), - da forma como já exposta acima.

O argumento aparenta alguma coerência, sobretudo quando toma como vilões as "frases rápidas" da linguagem usual entre os jovens no MSN e em outros meios quejandos, pois estamos mesmo acostumados a imputar ao "internetês" a cacografia dramática observada nas redações dos nossos estudantes. Tudo soa conforme às nossas impressões formadas pelo nosso conhecimento superficial que acumulamos sobre a matéria, e ficamos com a sensação de que deve ser mesmo assim, sobretudo por vermos nossas impressões iniciais desposadas por alguém com autoridade suficiente para fazê-lo sem parecer merecedor de maior contestação.
Entretanto, temos, antes do mais, de pensar no que consiste uma "idiotização" dos jovens. Ser idiota é não conseguir terminar o segundo grau sem conseguir resolver equações do segundo grau? ou não conseguir redigir um texto conciso totalmente acomodado às regras da norma culta do idioma em que se fala? ou tudo isso junto? A colocação precisa do tema pode levar-nos a lugares ainda inexplorados na discussão. Mais: a contextualização mais exata do problema, com a precisa consideração dos pressupostos ordinariamente admitidos, poderão revolucionar as conclusões mais usuais.
Identificar a "idiotização" em questão ao processo por que os jovens se descuraram da "leitura de livros" e passaram a gastar grande parte de seu tempo em redes sociais e em leituras de blogs como este não serve sequer como descrição acurada dele (processo). Nem se precisa dizer que vai muito longe de lhe oferecer uma análise detida de suas causas.
Podemos dizer de uma tal “idiotização” que ela consiste em uma depreciação – em média – de algumas faculdades que os jovens de gerações pretéritas tinham em níveis mais altos (ou mesmo jovens contemporâneos de outras localidades) que os da atual. Não importa tanto aqui discriminarmos tais faculdades; é-nos vultoso apenas termos bem claro que consistiu na diminuição de cabedais detidos pela média de outros grupos de jovens.

A análise das causas desse fenômeno e a indicação de sua terapêutica requerem as reflexões mais acuradas. A justificativa segundo a qual ele se deve à utilização de uma linguagem mais pobre, ainda que admitida como resolução do problema “causa” da “idiotização”, pouco ou nada aponta acerca de sua terapêutica. Vejamos um outro trecho da entrevista:

“ÉPOCA – Como os jovens reagirão se seus pais pararem de pagar suas contas de celular e internet por causa da crise?
Bauerlein – Vão espernear e berrar feito crianças de 2 anos. Mas no fim será bom. Serão obrigados a amadurecer.”²

Não sei quanto a vós, ó leitores (se é que há mais de um (aliás, se é que há algum)), mas a mim esta resposta causa arrepios, qual vos deve causar arrepios, por exemplo, a opinião de que a solução para o alcoolismo deve ser a destruição de todas as garrafas do mundo. A comparação pode parecer absurda, mas se lembrarmos que em ambas as hipóteses há a idéia fundamental de que somente se ataca a maneira como os problemas se nos apresentam, e não as causas geradoras deles, veremos que a ratio subjacente às duas é substancialmente a mesma.
Nesse diapasão, percebemos quão preconceituosa é a linha de raciocínio do professor indigitado: a internet sempre faz mal, e a proibição do seu acesso é algo que conduzirá, obrigatoriamente, a um "amadurecimento"; ler (um livro) sempre dá trabalho. Esse tipo de generalização é (ou pelo menos pode ser) funesto para a compreensão adequada deste fenômeno. Para isso, é bastante dizer que nem todo uso que se faça da internet seja tal que a sua vedação leve a um "amadurecimento". Além disso, em livros volumosos de edições luxuosas podem estar encerrados conteúdos muito menos "amadurecedores" do que o que se encerra neste humílimo blog. Não necessito de ir muito além nesta explicação.
Disso, imagino que posso concluir (e vos levar comigo em tal conclusão) que as "frases curtas e de rápida leitura", exatamente como os períodos longos e rebuscados dos romances lidos nos parques, são apenas, para dizer com o Prof. Richard Dawkins, memes³ que se replicam, mais ou menos, de acordo com as condições que encontram no meio em que se buscam dispersar; nesse sentido, podemos dizê-los neutros, por admitirem em si quaisquer conteúdos - inclusive, pois, os "idiotizantes".
E exatamente nas condições que estes memes encontram está um ponto crucial da questão. É a partir delas, ou a partir da adaptação a elas, que fará mais sentido o uso de frases curtas de leitura rápida ou frases longas de difícil compreensão. Aqui, finalmente, posso explicar o que quis dizer quando falei em algo como investigação mais próxima dos pressupostos admitidos por todos nesta discussão.
Quando o professor fala em ignorância da dura realidade de outras partes do mundo, ele lembra que as circunstâncias (culturais, econômicas etc.) em que os jovens "idiotizados" estão insertos são outras, bem diferentes das em que se encontram os outros jovens que lhes servem de parâmetro. Em resumo, podemos dizer seguramente que outras circunstâncias fazem surgir necessidades para os indivíduos, as quais desafiam, por seu turno, investidas várias para o alcance das suas satisfações. Não é demais lembrar aqui que, como aplicação elementar da lei do menor esforço, os indivíduos buscam a satisfação das suas necessidades da maneira menos onerosa, ainda que façam, muita vez, péssimos cálculos.
Para o assunto levantado, isso quer dizer que os jovens utilizam frases curtas ou longas, lêem romances ou blogs, escrevem cartas longas com caligrafia clássica ou scraps de emoticons, de acordo com a necessidade apontada por uma meta pré-estabelecida, além da qual tudo é desperdício de tempo e energia. Por óbvio, realidades mais amenas poderão trazer as metas para limites bem mais modestos; é dizer: uma comunicação instantânea e de pouca importância não requer frases longas e de difícil compreensão.
Isso significa que o "amadurecimento" não advirá do corte do telefone ou da internet, pelo menos não necessariamente. Os memes estão sempre atrás de novas máquinas de sobrevivência por que possam se replicar. E estas podem ser uma gravura, um gesto, o MSN, o Mirc, o facebook etc. Atacar sempre estas máquinas de sobrevivência será, no final das contas, uma mutilação da cultura humana pelo próprio homem. A solução viável parece-me ser uma reedução mental que institua novas necessidades e redimensione as metas a serem atingidas. Somente assim poderemos atingir um "amadurecimento" sustentável e conectado a quaisquer meios de difusão da cultura, coisa a que jamais nos levará o corte do telefone e da internet.
___________________
1 O tema renderá novo escrito, que virá a lume dentro em breve.
3 Sobre os memes, escreveu o ilustre professor de Oxford: "O novo caldo é o caldo da cultura humana. Precisamos de um nome para o novo replicador, um substantivo que transmita a idéia de unidade de transmissão cultural, ou uma unidade de imitação." A partir da raiz grega Mimeme, o Prof. Dawkins chega a meme. Ver DAWKINS, Richard. O Gene Egoísta. Itatiaia/Edusp. 1979. p. 214.









Saturday, September 27, 2008

Esquina

Esquina é onde uma rua faz a curva
E vira outra
É o momento de tensão entre a linha de chegada
E o ponto de partida
Aresta em que dois sentidos se fundem
E formam uma quina
Na qual um influxo passa
E outro desvia

Saturday, June 07, 2008

Ainda sobre o Inevitável

Poderá a Vontade
Ante a inevitabilidade
Das coisas
Ao menos antecipá-las
E trazer para daqui a pouco
O angustiantemente longínqüo
Dois mil cento e cinqüenta e oito?

Saturday, May 17, 2008

Dialética

-?
-!
-.

Friday, November 09, 2007

Na parada de ônibus

Eu estava apressado. O ônibus, claro, custava a passar. A pressa que se tem e o tempo de espera até a chegada do ônibus por que se aguarda guardam uma relação de inversa proporcionalidade.
Eu até poderia ir a pé. Não seria uma longa caminhada. Mas eu estava apressado.
Os carros não paravam de passar. Já os ônibus...
Eu olhava os carros. Eles passavam. Apressados.
Procurei algo que me servisse de alento até a chegada do ônibus por que eu esperava. Olhei todos os carros que passavam por mim. Contei 103.
Destes, 83% passariam rigorosamente em frente ao local para o qual eu me destinava. Destes, 74% iam somente com o motorista. Nenhum lotado.
Parei de contar. O ônibus chegou.
Demorei tanto quanto se tivesse ido a pé. Mas eu estava apressado.